Que luz é essa que atravessa a chuva teimosa, insistente em cair, em alarido? Incêndio tímido sob a chuva? Traçado de íris? Olhos de Lia? Uma meta? Um desafio?
Perpassa as folhas úmidas e verdes da pitangueira, no canto do jardim, de espreita, a colorir meus olhos tristes de uma esperança sem ameaças. Flama de outono em pleno verão a trazer lirismo à rotina, a cutucar a monotonia.
Um esboço expressionista ao ar livre? Uma instalação no meu quintal? Um desejo? Uma saudade?
Um vagar que fulgura e não morre, cala o que há de ruidoso no cinza. Cala a verticalidade e corta, sem pedir licença, o escuro. Abraça e abrasa.
Contraponto, contracanto, contratempo? Rebelde diante da cortesia repetitiva da chuva a encharcar a roseira e a tombar seu galho já pesado. Imprudente com a simetria chumbo do céu. Um momento.
Tão intenso e doce quanto a canção de Lenine.
Espontâneo-inesperado, que doura um trecho tímido desta tarde e me comove.