Há uma fome mais funda que a fome, mais exigente e voraz que a fome física: a fome de sentido e de valor; de reconhecimento e acolhimento; fome de ser – sabendo-se que só se alcança ser alguém pela mediação do olhar alheio que nos reconhece e valoriza. Esse olhar, um gesto escasso e banal, não sendo mecânico – isto é, sendo efetivamente o olhar que vê – consiste na mais importante manifestação gratuita de solidariedade e generosidade que um ser humano pode prestar a outrem. Esse reconhecimento é, a um só tempo, afetivo e cognitivo, assim como os olhos que veem e restituem à presença o ser que somos não se reduzem ao equipamento fisiológico. O olhar (ou a modalidade de percepção fisicamente possível) que permite ao ser humano o reencontro com sua humanidade é o espelho pródigo que restaura a existência plena, reparando o dano causado pelo déficit de sentido, isto é, pela invisibilidade. Esse olhar vê o outro, restituindo-lhe – ao menos potencialmente – o privilégio da comunicação, do diálogo, da troca de sinais e emoções, da partilha de valores e sentido, da comunhão na linguagem. Esses olhos que veem tecem entre as pessoas a ligação que é a matriz do que chamamos sociedade.
SOARES, Luis Eduardo. Cabeça de Porco. Rio de Janeiro: Objetiva, 2005. p.215/216
Ola! Por que nao entrevista a RACHEL SHEHERAZADE, esta sim, eh exemplo de mulher? Deus ti abencoe!